O movimento franciscano, enxerga a vida de minoridade como um pilar importante do carisma, e este se dá na relação com o outro, com a fraternidade, na proximidade. O olhar de irmão e irmã menor, é uma forma de ser e estar no mundo, uma relação de seguimento dos passos do próprio Cristo, Humilde e Crucificado.
“Ser irmão, ser irmã menor é ver no outro alguém maior, digno de respeito e reverência, porque criado à imagem e semelhança de Deus. A minoridade franciscana e clariana implica na atitude de saída de sí mesmo para colocar-se, com humildade, a caminho do encontro com o outro, a fim de servi-lo em suas necessidades e dele cuidar.” (AZEVEDO)
Este serviço é uma atitude de proximidade com o outro, aqui pode-se compreender com a atitude do serviço, uma dimensão importante da vida de minoridade. Isso implica em muitas vezes, sair de si e ir ao encontro do outro, onde ele está e muitas vezes não onde eu desejaria estar, na simplicidade do gesto de abaixar-se colocando-se na posição de igualdade em relação ao outro. A minoridade como forma de ser, se traduz como uma atitude interior na relação com o outro, tomar consciência da relação de interdependência entre os irmãos e irmãs criaturas do Altíssimo Senhor, reconhecendo a presença grandiosa de Deus na vida do(a) irmão(ã), mesmo em nossa fragilidade e pequenez, “A minoridade contrapõe-se à autossuficiência e ao sobrepor-se aos outros”(AZEVEDO).
Quais as características da minoridade vivida por Clara de Assis e suas Irmãs? Podemos refletir algumas características que revelam um pouco da espiritualidade de Santa Clara de Assis, pelo menos as que nos apresentam as fontes Francisclarianas.
- Minoridade clariana no serviço
Nos Evangelhos, a reverência do Cristo é revelada nas atitudes, na inclinação do corpo, como por exemplo o lava pés, neste gesto se revela o amor do mestre através da minoridade do serviço para com o outro. Santa Clara de Assis busca a prática da minoridade do serviço. Os testemunhos de suas irmãs no processo de canonização, revelam suas práticas:
“Quando mandava às irmãs que fizessem alguma coisa, fazia-o com muito respeito e humildemente e, a maior parte das vezes, preferia fazer ela mesma em vez de mandar as outras”[1]
“Era humilde, benigna e amável para com suas irmãs. Servia-as e lhes lavava os pés e derramava àgua em suas mãos.”[2] ”À noite cobria as irmãs por causa do frio”[3].
“Contentava-se com uma só túnica de pano rude e um manto. E se alguma vez via alguma túnica das irmãs que era mais vil do que ela estava usando, tomava-a para si e dava à irmã a sua melhor”.[4]
Santa Clara de Assis em seus gestos demonstra esta dinâmica do ir ao encontro com o coração aberto para aqueles e aquelas que mais necessitam, Clara de forma gratuita se abaixa para servir os que sofrem as enfermidades físicas, sociais e espirituais, aliviando o fardo, pelo exemplo do amor misericordioso do Cristo humilde e crucificado.
“Quando via alguma irmã em tentação ou tribulação, chamava-a em particular e consolava-a entre lágrimas e às vezes até se prostrava a seus pés”[5]
“ Foi diligentíssima na exortação e no cuidado das irmãs, sendo compassiva com as doentes”[6]
“Tinha grande compaixão pelas irmãs e pelos aflitos”[7]
- A minoridade clariana na pobreza
Para maior parte da sociedade atual, a pobreza se compreende apenas como uma situação social de quem não tem moradia, não possui o alimento, a falta de recursos próprios para saúde básica e estudos. Essa pobreza existe, mas não é a pobreza dos votos religiosos. Esse tipo de pobreza deve ser combatida por se tratar de uma injustiça social. A vida de pobreza e simplicidade de Santa Clara de Assis é a do Cristo:
“ A pobreza de Jesus é ter nascido pequeno e humilde, quando poderia ter vindo na grandeza de Deus. O Jesus do presépio mostra que podemos reagir a uma das maiores tentações: possuir tudo que cair sob nossos olhos, o que cria a pobreza social. Quem possui tornar-se dono. Jesus não quis ser dono de nada.” (PEDROSO)
É buscar a pequenez em uma vida pobre como o Cristo foi humilde e pobre, Santa Clara desde o início da Ordem, defendeu o “privilegio da pobreza”, guardando a ela e as irmãs de possuírem alguma coisa que desviasse os seus olhos do crucificado, pobre e humilde, ao qual elas tinham como modelo a seguir. Todas eram irmãs, e não havia entre elas privilegiadas, mesmo as que vinham de uma família rica, todas buscavam ser irmãs menores. O Papa Gregório IX ao visitar Santa Clara lhes propôs, como está escrito na Legenda de Santa Clara (LSC):
“ O Senhor Papa Gregório, de feliz memória, digno de veneração pelos méritos pessoais e mais ainda pelo cargo , amava com especial afeto paterno a nossa santa. Quando tentou convencê-la a aceitar algumas propriedades que oferecia com liberdade pelas circunstâncias e perigos dos tempos, ela resistiu com ânimo fortíssimo e não concordou, absolutamente. Respondeu o Papa: “Se temes pelo voto, nós te desligamos do voto”, mas ela disse: ”Pai Santo, por preço algum quero ser dispensada de seguir Cristo para sempre” (LSC 14)
Na Segunda Carta de Santa Clara a Santa Inês de Praga ela aconselha que Inês “Abrace o Cristo pobre como uma virgem pobre”(2CtIn 18), isso se trata de se tornar pequena, menor, pobre, deixando o maior espaço interior para que Deus habite, quem deixa tudo para seguir os passos de Cristo deve abraça-lo com o coração pobre.
- Quais são hoje as realidades e situações que clamam pela vivência da minoridadevivida por Clara e Francisco?
A minoridade a qual São Francisco e Santa Clara de Assis, buscaram viver e ensinar aos seus irmãos e irmãs, é um sinal profético nos tempos atuais, uma espiritualidade que se dá na relação de proximidade com o outro mas não para se sobressair ou através de interesses próprios, mas sim uma saída de si, uma saída de seu egocentrismo, individualismo, prepotência para encontrar com o irmão e a irmã, construir laços de fraternidade. Isso nos faz refletir a sociedade competitiva, onde os mais fracos são vencidos pelos mais fortes, onde os doentes, não são visitados ou não despertam em mim o desejo de me abaixar para lavar seus pés e tratar as enfermidades físicas, sociais ou espirituais. A minoridade desperta para a consciência da interdependência, entre os seres humanos e criaturas de Deus.
A minoridade deve motivar a abrir espaço dentro de si, para que Deus apareça e eu diminua, ter um coração pobre inspirado no coração de Cristo. A minoridade de reconhecer a pobreza de Cristo na manjedoura e também crucificado, revelando a grandeza de seu amor por nós, e por fazer a experiência desse amor, desejar através da minoridade de coração ir ao encontro do meu próximo para servir como irmão e irmã menor.
Frei Mendelson Branco da Silva, OFM
Referencias:
AZEVEDO, Irmã Mônica de. A minoridade em Clara de Assis. [S. l.], 2019. Disponível em: http://www.estef.edu.br/moodle/mod/resource/view.php?id=8126. Acesso em: 28 jun. 2019.
PEDROSO, Frei José Carlos Corrêa. O Cristo que ela abraçou. In: PEDROSO, Frei José Carlos Corrêa. Abrace o Cristo Pobre. [S. l.]: Centro Franciscano de Espiritualidade, 19??. Disponível em: http://www.estef.edu.br/moodle/pluginfile.php/15608/mod_resource/content/1/O%20Cristo%20que%20ela%20abra%C3%A7ou.pdf. Acesso em: 27 jun. 2019.
[1] 1ª testemunha
[2] 1ª testemunha
[3] 2ª testemunha
[4] 2ª testemunha
[5] 10ª testemunha
[6] 6ª testemunha
[7] 3ª testemunha